Construída sobre as águas no encontro dos canais da Generalíssimo e da Dr. Moraes, a área conhecida como Ilha Bela deveria abrigar hoje apenas 96 imóveis de famílias que ali chegaram, há mais de 30 anos, por não ter outro lugar para morar. Mas, esse número é remanescente do último levantamento, realizado em 2018, quando houve a última tentativa da prefeitura de retirar os moradores.
A realidade social e o número exato de famílias que ocupam hoje imóveis na Ilha Bela serão revelados agora pelo novo cadastro social que a Prefeitura está realizando na área por meio da Unidade Coordenadora do Programa de Saneamento da Bacia da Estrada Nova – UCP/Promaben e do consórcio TPF/Synergia.
Desde a última vez em que se tentou desobstruir os canais, há três anos, casas já caíram, novas já foram levantadas, os terrenos já foram repassados e os moradores da Ilha Bela seguem levando suas vidas, algumas vezes em barracos improvisados, outros em casas mais estruturadas de alvenaria construída em área aterrada, alguns tirando de lá o sustento de uma vida inteira como é o caso do barbeiro Gilberto Souza da Silva, 60 anos.
Ocupando um cômodo de madeira sobre o canal da Quintino de dois por um metro e meio, Gilberto se orgulha da profissão aprendida na República de Emaús, entidade que ensinava profissões a adolescentes pobres entre as décadas de 80 e 2000 nas redondezas, capitaneada pelo Pe. Bruno Secchi. O local apertado, abriga não só a cadeira de barbeiro e seu espelho iluminado, mas também e, principalmente, a coleção de livros que o barbeiro gosta de exibir. “Eu adoro livros, adoro ler, esse aqui eu encontrei semana passada no lixo aqui perto” e apresenta uma edição escolar da História da Humanidade.
Apesar do estúdio pequeno abrigar toda sua história de vida, Gilberto está ansioso para sair da área. “Aqui já foi bom, sabe? Eu tinha muitos clientes, mas eu já estou enxergando mal, eu tenho óculos, mas eles não servem mais direito e óculos é uma coisa cara, né? Agora aqui está essa guerra por território de venda de drogas, tem muito tiro, olha aqui, aqui é marca de tiro, a sorte é que eu não estava aqui na hora”, ele aponta os buracos na parede enquanto lamenta a situação atual da Ilha Bela.
Outro que também sobrevive ali é Sandro da Silva Souza, de 51 anos, dono de um pequeno comércio de bombons e miudezas na frente de uma das pontes que dão acesso ao local. Sandro conta que nasceu e se criou na área, também foi educado nas oficinas da República de Emaús onde, segundo ele, aprendeu a não se meter com coisa errada. Ele tem esperança de ser indenizado para melhorar de vida. “Nosso maior objetivo é ir para um lugar melhor, aqui tá muito perigoso, queremos conseguir um lugar para morar bem, arranjar um outro jeito de viver”, acredita Sandro.
Além da violência crescente na Ilha Bela, o que também assusta os moradores são as enchentes, na casa do Ronaldo Pereira Sampaio, de 49 anos, a maior das preocupações é quando começa a chover. “O barraco aqui é nosso, eu comprei de um amigo há três anos, a gente sempre tenta manter arrumado, limpo, mas a chuva deixa a gente tenso, já vivemos situações complicadas aqui”, conta.
Assim como os outros entrevistados, a possibilidade de sair também preocupa Ronaldo. “Eu vivo de bicos, faço trabalho de eletricista, marceneiro, carpinteiro, pedreiro, encanador. Quando a gente está desempregado, faz de tudo para sobreviver. Meus clientes são todos daqui de perto, se eu sair daqui e for para longe, como vai ser? ”, questiona Ronaldo.
VIDA NOVA – Oferecer uma outra condição de vida para essas pessoas e acolher também suas demandas é o papel do Projeto Social do Programa de Saneamento da Bacia da Estrada Nova (Promaben). Até a próxima quinta-feira, 17 de junho, cerca de 30 cadastradores entre assistentes sociais e estagiários do Promaben e do Consórcio TPF/Synergia estarão na Ilha Bela conversando com os moradores, recolhendo informações sobre as condições de vida e moradia deles.
Depois do trabalho Social, a equipe de engenharia volta para realizar o Cadastramento Físico. Todos os imóveis e os terrenos serão medidos minuciosamente. A partir desse levantamento serão elaboradas as plantas baixas para a avaliação do valor de mercado atualizado dos imóveis.